domingo, 4 de outubro de 2015

A TRADIÇÃO RETÓRICA

Falar em persuasão implica, de algum modo, retomar uma certa tradição
do discurso clássico, na qual podem ser lidas muitas das formulações que
marcaram posteriormente os estudos de linguagem. Essa recuperação do
espaço cultural e lingüístico do mundo clássico é necessária, visto que a
preocupação com o domínio da expressão verbal nasceu entre os gregos. E não
poderia ser diferente, pois, praticando um certo conceito de democracia, e tendo
de exporem publicamente suas idéias, ao homem grego cabia manejar com
habilidade as formas de argumentação. Daí toda larga tradição dos tribunos, dos
sofistas, que iam às praças públicas, aos tribunais, aos foros, intentando inflamar
multidões, alterar pontos de vista, mudar conceitos pré-formados. Demóstenes,
Ouintiliano, Górgias, foram alguns desses nomes que ficaram célebres pela
habilidade com que encaminhavam suas lógicas argumentativas. Não é, pois,
estranho que a Grécia clássica tivesse levado a graus de sutileza a preocupação
com a estruturação do discurso. As escolas criaram, inclusive, disciplinas que
melhor ensinassem as artes de domínio da palavra: a eloqüência, a gramática, a
retórica, atestam algumas das evidências do conjunto de preocupações que
marcaram a relação dos gregos com o discurso.
Ademais, o problema não era apenas o de falar, mas fazê-lo de modo
convincente e elegante, unindo arte e espírito, bem ao gosto da cultura clássica.
A disciplina que cuidava especialmente de buscar tal harmonia era a retórica.
Segundo Oswald Ducrot e Tzvetan Todorov: “O aparecimento da retórica como
disciplina específica é o primeiro testemunho, na tradição ocidental, duma
reflexão sobre a linguagem. Começa-se a estudar a linguagem não enquanto
‘língua’, mas enquanto ‘discurso’” *. Ou seja, cabe à retórica mostrar o modo de
constituir as palavras visando a convencer o receptor acerca de dada verdade.
A retórica foi, porém, transformando-se em mero sinônimo de recursos
embelezadores do discurso, ganhando até um certo tom pejorativo. Um pouco
desta postura se deve a certas visões da retórica, como as desenvolvidas no
século XVIII e XIX, para quem já não se tratava mais de uma questão de
método compositivo, mas sim de buscar o melhor enfeite, a palavra mais bela, a
figura inusual, a expressão inusitada, à moda do ideário estético dos parnasianos.
Em nossos dias os estudos retóricos passaram a receber novas abordagens,
em especial no que diz respeito às figuras de linguagem e suas funções, como se
pode ler nas formulações do grupo de Jean Dubois, da escola de Liège.

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